O mundo culpará as condições meteorológicas (El-Niño), o efeito estufa, etc., mas será que os governos e seus líderes não têm a sua parcela de culpa?
O que diz a FAO e USDA nos relatórios de outubro de 2015:
FAO: “… as condições climáticas desfavoráveis em vários países provocam queda da produção mundial do arroz”.
“Na Ásia as chuvas insuficientes e tardias reduzem a produção na Indonésia, Camboja, Índia, Tailândia e Vietnam. As tempestades e enchentes em Burma, no Egito e Madagascar, além das chuvas irregulares, o que mais afetou a produção foram as altas temperaturas”.
USDA (Departamento da Agricultura dos Estados Unidos): Constam as mesmas diversidades climáticas, porém ampliando a relação de países entre eles as Filipinas e a China. O Japão e o próprio Brasil, maior produtor das Américas, poderão ter suas produções reduzidas, mas que até o relatório de outubro ainda não foram computadas.
Falando nos relatórios da FAO e USDA, as diferenças das previsões são de 18 a 20 milhões de toneladas de arroz beneficiados, tanto na produção como no consumo. A FAO projetava a produção de 500 milhões e a USDA de 480 milhões toneladas. No entanto, no ultimo relatório a FAO previu 493 milhões e a USDA 475 milhões sendo o consumo inalterado e próximo dos 490 milhões de toneladas sendo que os dados da USDA quando conferidos individualmente, são dados oficiais de cada país.
Quanto aos dados divulgados pela FAO, fico observando e imaginando o peso da conta cobrada. Em 2008, um de seus Diretores, causou pânico no mercado quando, de posse de um pacote de 2 Kg de arroz, anunciou que o produto iria faltar na frente das câmeras de TVs do mundo todo. Na época, o alerta teve tamanha repercussão que o preço internacional da tonelada do arroz foi de U$300,00 para U$900,00 e os presidentes e ministros da agricultura de países reuniram-se na Itália em caráter de urgência. Depois de 2008 os preços mundiais se estabilizaram em U$550,00 até 2013.
É preciso compreender que a crise não é pela queda da produção ou estoques baixos, mas pelo aumento das necessidades mundiais: As necessidades de arroz dos países importadores na década de 80 eram em média de 11,9 milhões de toneladas, enquanto os estoques médios mundiais eram 78,9 milhões de toneladas. A segurança estratégica entre as necessidades e os estoques era 6,63 vezes maior. No decênio dos anos 90 as importações eram de 18,6 milhões e os estoques de 125,2 milhões. Com um índice 6,73 vezes maior. No ano 2000 segurança dos estoques caiu para 3,33 vezes, pois enquanto que as importações na média cresceram para 28,75 milhões, os estoques eram de apenas 95,73 milhões de toneladas. Na safra de 2006/07 o quadro ficou ainda pior e os estoques no mundo ficaram comprometidos, com uma importação de 31,9 milhões e estoques de 75,16 milhões toneladas, representado 2,36 vezes da necessidade alimentares. Esse quadro acendeu o alerta para a FAO que em 2008 chamou a atenção dos lideres mundiais para a segurança alimentar no que se refere a esse cereal.
De 2010 a 2014 as importações médias cresceram para 41,30 milhões de toneladas, com os estoques em 104,95 milhões na média e índice de 2,54 vezes da necessidade. A previsão em 2015 é fechar os estoques em apenas 88 milhões de toneladas, com uma necessidade de importação de 42,0 milhões e um índice de 2,10 vezes – o mais baixo dos últimos 50 anos!
O arroz é alimento básico para a segurança alimentar da maioria dos países, sendo por isso controlado. É uma situação diferente das demais culturas, cujos preços não pesam na cesta básica e tampouco estimulam os interesses eleitoreiros. Isso justifica porque o arroz se depreciou tanto ao ponto que um quilo (1 Kg) do grão, que rende em média, 10 refeições custa menos do que um cafezinho.
Usando o Brasil como referência, os produtores há tempo vêm se descapitalizando e saindo do mercado. Atualmente no Rio Grande do Sul a produção está concentrada, pois 80% da produção está nas mãos 20% de produtores de grande a médio porte, que se mantêm na atividade mais pela tradição e poder de barganha do que pela rentabilidade.
Na Ásia, onde se produz 90% da produção mundial, são todos pequenos e mini produtores e o arroz é cultura de subsistência. Os produtores de arroz chineses, por exemplo, a área média cultivada é de um hectare por família (com 5 pessoas) e o máximo de três hectares. Em 2011 o governo chinês lançou um plano agrícola empresarial familiar, se distanciando da política centenária de subsistência dos pequenos e mini produtores. Hoje se entende os diversos motivos que o levaram isso. Como uma família de produtor de subsistência cumprirá as responsabilidades sustentáveis (sociais e ambientais) cobradas pelo mundo?
Qual a lição? A culpa não é do El Niño. É dos Governos! Simples assim. Se os lideres do mundo permanecerem de costas para o panorama mundial, alienados do que esta acontecendo com os produtores de arroz e seus custos, principalmente na Ásia e não fizerem o dever de casa, o impacto da crise por falta do arroz poderá até passar despercebida por mais 2 ou 3 anos, mas não passara do próximo ciclo climático. Aí então, essa conta provocará um colapso no abastecimento mundial do arroz.
Qual a solução? Os governantes mundiais precisam chamar a iniciativa privada, garantir o livre mercado, colocar o arroz no mercado futuro nas bolsas de mercadorias e permitir que esse cereal assuma o status de commodity agrícola mais importante para segurança alimentar mundial.
Alegrete, 06 de novembro de 2015.
Gilberto Pilecco – Economista e Produtor Arrozeiro